Disputa entre o presidente da Assembleia e um deputado municipal do PSD levanta debate sobre transparência, proteção de dados e acesso à informação pública

O diferendo entre o presidente da Assembleia Municipal de Miranda do Douro, Óscar Afonso, e o membro eleito pelo PSD, Fernando Vaz das Neves, ganhou dimensão judicial. O caso, que tem por base a recusa do fornecimento do áudio de uma reunião plenária realizada em dezembro de 2024, foi levado ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela, que será agora chamado a pronunciar-se sobre o alcance do direito de acesso à informação administrativa no contexto autárquico.

O requerente, Fernando Vaz das Neves, sustenta que a gravação da sessão constitui um documento administrativo de acesso livre, conforme previsto na Lei n.º 26/2016, conhecida como LADA, e apoiado pela doutrina da Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (CADA). Alega que a omissão do presidente da Assembleia em fornecer o áudio viola o princípio da transparência e o direito de acesso à informação pública.

“Em 2023, um pedido idêntico foi satisfeito sem qualquer objeção. Não houve desde então alteração legislativa nem mudança de posição da CADA”, recorda o autarca social-democrata, que acusa Óscar Afonso de “incoerência” e de “falta de respeito institucional pelos membros da Assembleia”, assegurou Fernando Vaz das Neves, numa nota enviada para a redação do Canal N.

A RECUSA E OS FUNDAMENTOS DO PRESIDENTE DA ASSEMBLEIA

Na decisão final fundamentada proferida a 3 de outubro de 2025, Óscar Afonso reafirma a recusa de facultar a gravação. O documento, remetido ao requerente e à CADA, invoca múltiplos fundamentos jurídicos.

Segundo o presidente, as gravações sonoras das sessões “não constituem documentos administrativos autónomos, mas meros instrumentos de apoio à redação das atas”, que são, essas sim, os únicos registos oficiais e dotados de eficácia jurídica.

A decisão cita o Regimento da Assembleia Municipal, o Regime Jurídico das Autarquias Locais (RJAL) e o Código do Procedimento Administrativo (CPA), argumentando que nenhum desses diplomas impõe a gravação ou conservação dos registos áudio.

Mais ainda, sustenta que o acesso indiscriminado às gravações “poderia expor dados pessoais e opiniões políticas dos intervenientes”, em violação do Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados (RGPD) e dos artigos 26.º e 35.º da Constituição da República Portuguesa.

“Entende-se, salvo melhor opinião, que a disponibilização integral da gravação comprometeria direitos fundamentais e não se mostra necessária, uma vez que a ata da reunião foi aprovada por unanimidade, incluindo com o voto favorável do requerente”, lê-se no documento.

UM CASO QUE ULTRAPASSA O PLANO LOCAL

Para além do embate político entre dois eleitos de sensibilidades distintas, o caso levanta uma questão de fundo: deve o registo áudio das reuniões públicas ser considerado um documento administrativo acessível?

A CADA tem vindo a defender, em pareceres anteriores, que as gravações efetuadas pelos serviços de apoio das autarquias integram o conceito de documento administrativo, desde que não contenham matéria reservada. Contudo, várias autarquias sustentam que esses registos têm caráter meramente instrumental, sendo eliminados após a elaboração das atas.

O processo que agora chega ao tribunal poderá, assim, contribuir para clarificar a jurisprudência e uniformizar a prática administrativa no domínio do acesso à informação pública, um tema cada vez mais sensível num contexto em que os cidadãos exigem maior transparência, escrutínio e responsabilização dos eleitos.

UM CONFLITO PROLONGADO

O litígio entre Óscar Afonso e Fernando Vaz das Neves não é novo. Ao longo do mandato autárquico, que se aproxima do fim, têm-se multiplicado episódios de tensão e divergência na condução dos trabalhos da Assembleia Municipal.

Para o membro do PSD, a decisão de recorrer aos tribunais “não é apenas uma questão pessoal, mas de princípio”. “Os mirandeses não podem ficar reféns de resistências institucionais ou de interpretações restritivas da lei”, afirmou.

Por sua vez, Óscar Afonso, que tem o seu mandato a acabar, reafirma que a sua atuação “segue a lei e protege direitos fundamentais”, recusando qualquer motivação política na decisão.

Enquanto o tribunal não se pronunciar, o caso permanece como um teste à compatibilidade entre transparência administrativa e proteção de dados, e um exemplo paradigmático das dificuldades de equilibrar ambos os valores no exercício da governação local.

A Redação,

Foto: DR

Dizeres Populares TASTY ARREGUILAR OS OLHOS Mirandela Braganca 730x90px
IMG_9798
Dizeres Populares BIG MAC VAI NUM AI Mirandela Braganca 730x90px
Design sem nome (5)
banner canal n
Banner Elisabete Fiseoterapia
Alheiras Angelina
Dizeres Populares BATATAS TAO ESTALADICAS Mirandela Braganca 730x90px
Artigo anteriorDEPUTADO AMÍLCAR ALMEIDA REPRESENTA PORTUGAL NO I FORÚM PARLAMENTAR IBERO-AMERICANO PELA SEGURANÇA ALIMENTAR
Próximo artigoEDUARDO TAVARES TOMA POSSE COMO PRESIDENTE DA CÂMARA MUNICIPAL DE ALFÂNDEGA DA FÉ