Artigo de opinião escrito por Lídia Praça
Hoje não vou contar uma história de Abril, mas do Homem que morreu em abril
Buenos Aires fervilhava, como sempre, com sua energia inconfundível. Nesse dia, bem no coração da cidade, num bairro de casas simples e ruas movimentadas, nasceu Jorge. Desde pequeno, os livros eram o seu refúgio e as perguntas sobre a vida, o seu alimento. Na escola encantou-se pelo estudo e, mais tarde, pela engenharia química. Foi um jovem como tantos, que se divertia, que sonhava, que conheceu o amor. Namorou com Amália, que lhe apareceu como uma brisa suave, transformando os seus dias em poesia. Entre cafés partilhados e passeios pelas margens do Rio da Prata, Jorge descobriu o sentido do afeto verdadeiro. Mas, no fundo de sua alma, uma inquietação crescia.
O tempo passou, e numa manhã comum, diante da capela onde tantas vezes rezara, Jorge percebeu que a sua jornada seguiria outro rumo. O amor por Amália era profundo, mas havia um amor maior que o impulsionava – o amor por Deus e pelos mais necessitados. Com lágrimas nos olhos e um coração dividido, escolheu o caminho do sacerdócio. Ingressou na Companhia de Jesus e abraçou uma vida de serviço. Nas ruas da cidade, caminhou ao lado dos pobres, ouviu as suas mágoas e aprendeu sobre a beleza da simplicidade. A sua humildade e bondade eram marcantes e desconcertantes. Tornou-se cardeal e, mesmo entre majestosas e mediáticas responsabilidades, nunca perdeu sua essência. E, um dia, numa atmosfera carregada de expectativa, o inesperado aconteceu e o seu nome ecoou além dos muros do Vaticano. Jorge Bergoglio tornara-se Papa e quis chamar-se Francisco. O Papa Francisco, que jamais se veria como um líder tradicional, recusou pompas, preferiu a proximidade e defendeu um mundo “menos frio e mais justo e uma Igreja para todos, todos, todos”.
E assim foi. Com gestos simples e palavras carregadas de ternura, Francisco conquistou os nossos corações. Visitou os esquecidos, abraçou os doentes, sentou-se ao lado dos que não tinham voz. O mundo viu nele a promessa de uma fé acolhedora, de uma igreja onde o amor era maior do que as regras. Cada dia era um novo desafio, mas em cada sorriso, em cada olhar repleto de gratidão, Francisco encontrava forças para seguir. Não era um Papa convencional, mas era o Papa necessário e o seu legado não estava apenas nas palavras, mas na maneira como fez o mundo sentir que, independentemente da fé, do passado ou das diferenças, todos mereciam ser parte da casa de Deus.
Ontem, Francisco morreu. Morreu, poucas horas depois de ter estado no meio de nós. Ontem, Francisco morreu e, por qualquer razão que não consigo explicar, hoje sinto frio. Bem sei que ele nos pediu-nos para sermos “empreendedores de sonhos e não admiradores de medos”. Não sei se serei capaz, mas vou tentar … vou tentar, Papa Francisco!