Artigo escrito por Sofia Bernardino, enfermeira na ULSTMAD, membro da Associação de Profissionais de Saúde do Alto Tâmega (APSAT)


A questão sobre se somos saudáveis ou doentes “até prova em contrário” é uma reflexão filosófica que nos convida a repensar nos limites entre a saúde e a doença. 

Como já referi algumas vezes, nos meus artigos, sou doente oncológica. Fui diagnosticada com cancro da mama após eu detetar uma alteração palpável, até à data do resultado da biópsia fui considerada saudável. O meu corpo nunca revelou qualquer sintoma, foi uma progressão silenciosa, e só começou a dar sinais de fragilidade com o acumular dos tratamentos. Sob o meu ponto de vista, até ser tratada eu sempre fui saudável… o que me deixou doente foi a cura! Refletindo sobre esta temática, várias questões surgem como que exponencialmente: Mas será que a saúde é realmente uma ausência de doença? Ou será que a doença só existe quando é comprovada, diagnosticada, nomeada? Afinal, somos saudáveis ou doentes até que algo se manifeste para contrariar essa ideia?

A palavra “saúde” deriva do latim “salus”, que significa integridade, segurança, bem-estar. Segundo a Organização Mundial da Saúde, saúde é “um estado de completo bem-estar físico, mental e social e não apenas a ausência de doença ou enfermidade”. Essa definição, embora ambiciosa, expande o entendimento tradicional, que costumava limitar-se à ausência de sintomas ou de diagnóstico médico. No entanto, a saúde pode ser vista como um contínuo, e não apenas como um estado fixo. Cada pessoa possui o seu próprio nível de saúde, que oscila ao longo do tempo, influenciada por fatores biológicos, ambientais, sociais, emocionais, culturais ou até mesmo espirituais. O conceito de saúde é, assim, dinâmico e relativo: o que é saudável para um indivíduo pode não o ser para outro, e o mesmo vale para populações, culturas, sociedade em geral.

Desde o meu tempo de formação como enfermeira, que oiço ser comum distinguir a saúde objetiva (que é mensurável: por exames, avaliações clínicas e parâmetros científicos) e saúde subjetiva (que é a perceção individual sobre o próprio bem-estar). Muitas vezes, alguém pode sentir-se saudável apesar de apresentar alterações clínicas, enquanto outra pessoa pode sentir-se doente e sem evidências patológicas. Eu assumo-me como um exemplo claro desta ambiguidade, portadora de neoplasia da mama, só diagnosticada após palpação por mim, e sempre saudável, como já referi os primeiros sintomas de doença surgiram com o acumular dos tratamentos de quimioterapia.

Esta subjetividade é fundamental na abordagem contemporânea da medicina e da saúde coletiva, com reconhecimento da importância da experiência pessoal, do contexto, da cultura e das expectativas individuais. Sendo, a saúde mental, um domínio no qual essa subjetividade, ainda nos dias de hoje, tem um peso significativo, pois não basta a ausência de diagnóstico físico para que alguém se sinta bem.

Se até agora, abordei o conceito de saúde, é pertinente refletir concetualmente sobre a doença. Tradicionalmente, é definida como uma alteração ou desvio do estado de saúde, que se manifesta por sinais e sintomas específicos e pode ser identificada, nomeada e classificada. O termo deriva do latim “dolentia”,significado de sofrimento ou dor sob perspetiva biomédica, psicológica ou até sociocultural. 

A frase “até prova em contrário” remete à ideia de que, sem evidências objetivas (ou seja, sem sintomas, exames, diagnósticos), supõe-se que o estado é saudável. Só se considera doente quem apresenta provas contrárias. Este paradigma orienta práticas médicas e sociais: avaliações regulares, rastreios, exames… tudo para identificar precocemente sinais que apontem para o estado de doença: o diagnóstico como prova! Mas o diagnóstico é apenas uma ferramenta, e pode estar condicionado por diversos fatores: há doenças silenciosas, que não se manifestam até etapas avançadas, e há condições que dependem da interpretação e experiência profissional, do contexto e das ferramentas (tecnologia, meios complementares de diagnóstico) disponíveis. Pode-se afirmar que, em muitos casos, a doença só existe quando alguém a nomeia, regista ou comunica.

Culturalmente, partimos do princípio de que a pessoa está doente a não ser que algo prove que está saudável e por isso recebe-se sempre um medicamento. É uma diferença de filosofia, de cultura que se encontra enraizada até aos dias de hoje. Na medicina moderna, assistimos a uma mudança de paradigma com reconhecimento de fases intermediárias, assim, não somos apenas saudáveis ou doentes, mas pode dizer-se que habitamos numa zona cinzenta e dinâmica, onde a saúde e a doença coexistem, competem entre si e individualmente vamos alternando no nosso estado.

Perguntar se somos saudáveis ou doentes até prova em contrário é mais do que um exercício retórico: é um convite à vigilância, à curiosidade e à reflexão. Não se trata de viver em permanente angústia (à procura incessante de um diagnóstico), mas de reconhecer que a saúde é um estado provisório, sujeito a mudanças e desafios. Na realidade são essas dúvidas que motivam os rastreios, a prevenção e o cuidado contínuo. Para o indivíduo, pode ser fonte de ansiedade, mas também de atenção a si próprio, de autoconhecimento e procura ativa por qualidade de vida. Na sociedade em si, orienta políticas públicas de saúde, campanhas de prevenção e estratégias de saúde coletiva.

Somos saudáveis ou doentes? Talvez sejamos ambos, ao mesmo tempo, até que a vida, em sua constante mudança, nos prove o contrário

… Vale a pena pensar nisto!

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